quinta-feira, 30 de junho de 2011

Genes que predisporiam algumas pessoas a habilidades intelectuais elevadas seriam os mesmos que disparam doenças como autismo e esquizofrenia.

Autismo é o preço da inteligência, diz descobridor da estrutura do DNA CLAUDIO ANGELO -enviado especial da Folha de S.Paulo a Cold Spring Harbor (EUA)

James
Watson, codescobridor da estrutura do DNA, pai da biologia molecular e
polemista profissional, tem uma nova teoria para explicar a suposta
genética da inteligência. Os genes que predisporiam
algumas pessoas a habilidades intelectuais elevadas seriam os mesmos
que disparam doenças como autismo e esquizofrenia.
Coincidentemente,
é essa a hipótese que um grupo de pesquisadores da Universidade do
Colorado está desenvolvendo. Os dados foram apresentados na semana
passada nos Estados Unidos, logo depois de Watson ter delineado suas
ideias.
"Isso é muito especulativo. Não posso provar", admitiu à
Folha o biólogo, de 81 anos. Mas a inteligência, continuou, é rara
porque casais inteligentes têm probabilidade mais alta de terem filhos
com problemas. "E esses genes tendem a ser eliminados pela seleção
natural."
Watson apresentou sua tese durante o 74º Simpósio de Cold
Spring Harbor sobre Biologia Quantitativa, organizado pelo laboratório
do qual ele era chanceler --até ser demovido do posto no fim de 2007 por
ter feito comentários racistas.
Longe de se retratar pelo episódio,
Watson ainda sugeriu, durante sua apresentação, que outro motivo pelo
qual a inteligência é rara é que "as pessoas inteligentes pagam por
dizerem a verdade. Sei disso por experiência pessoal".
Autorreferência
O cientista começou a desenvolver sua hipótese depois de ter sido o primeiro ser humano a ter o genoma sequenciado.
"Fiquei assustado, descobri que tinha mutações em três genes ligados ao reparo do DNA".
Esses
genes, como o BRCA1 e o BRCA2, entram em ação para corrigir danos
causados durante a replicação do DNA ou por uma agressão do ambiente,
como radiação. Mutações neles estão ligadas ao câncer.
"Pessoas com essas mutações tendem a ter filhos especiais", disse. Watson tem um filho esquizofrênico.
Os
mutantes são mais inteligentes que a média e têm menos filhos --e, de
acordo com Watson, têm problemas para se relacionar com as outras
pessoas. Veja os cientistas.
Supostamente, os genes da inteligência
seriam eliminados pela seleção natural. "Mas por que eles não somem e a
humanidade não fica mais estúpida?"
Elementar, afirma Watson. As
sociedades que têm indivíduos com alta cognição, como Einstein e Darwin,
se beneficiam. O processo evitaria o expurgo da inteligência -e da
esquizofrenia- do "pool" genético dessas populações.
Faca de dois gumes
Menos
especulativa é a ligação entre cognição e doenças mentais feita pelo
grupo de James Sikela (Universidade do Colorado). Ele e seus colegas
descobriram uma correlação entre o alto número de cópias de um gene numa
certa região do DNA humano e o desenvolvimento do cérebro. Essa região,
dizem outros estudos, estaria também implicada com autismo e
esquizofrenia.
Os pesquisadores identificaram que uma região
instável do genoma chamada 1q21.1 concentrava um número alto de cópias
de um gene chamado DUF1220. "A relação de causa e efeito não está
provada, mas nós relatamos uma correlação" entre o aumento do número de
cópias desse gene na linhagem humana e o aumento do cérebro, disse
Sikela à Folha.
Essa instabilidade é "uma faca de dois gumes". "Ela
teria permitido mais cópias do DUF1220 e, portanto, teria sido retida na
evolução. Por outro lado, essa instabilidade não é precisa e pode gerar
um embaralhamento deletério de sequências.
É por isso que os vários
estudos recentes que têm relacionado variação no número de cópias na
região 1q21.1 no autismo e na esquizofrenia chamaram nossa atenção: isso
se encaixa na ideia de que os indivíduos com essas doenças são o preço
que a nossa espécie paga pelo mecanismo que permitiu e permite a geração
de mais cópias da DUF1220."
Sikela disse que Watson não sabia de
seus dados e que o mecanismo sugerido por ele é diferente. "Mas, em
teoria, outras regiões do genoma poderiam se encaixar no modelo."

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